Aquela pessoa que leva tudo pro lado pessoal

Todo mundo conhece alguém (ou talvez você seja essa pessoa) que leva tudo pro lado pessoal.
Não importa o contexto, parece que qualquer coisa é interpretada como uma crítica, um esquecimento ou uma rejeição.

Sabe quando você comenta algo simples, como:
“Ah, semana passada eu fui na pizzaria com fulano.”
E a pessoa responde, meio em tom de brincadeira, meio de verdade:
“Nossa, nem me chamou… achei que a gente era amigo.”

No começo, pode parecer só uma observação leve, até engraçada.
Mas com o tempo, a convivência vai ficando cansativa.
Parece que qualquer movimento precisa ser calculado, qualquer escolha precisa ser justificada.
Como se você precisasse constantemente provar que gosta, que se importa, que não está deixando o outro de lado.

Só que o que pouca gente enxerga é o que existe por trás disso.
Por trás da reatividade, da cobrança, dessa “brincadeira”, e da necessidade de estar sempre presente, há muita dor e medo de se ver sozinha.
Algo que ela aprendeu a fazer há tanto tempo e de forma tão automática que não sabe de onde vem e por vezes nem percebe o que está fazendo.

Essa dor nasce da sensação de não ter sido suficiente.
De ter precisado disputar atenção desde cedo com irmãos, com o trabalho dos pais, com o silêncio da casa, ou com situações que muitas pessoas julgariam como “bobas demais”.
É uma sensação que empurra você desde cedo a tentar conquistar o afeto através do esforço. Porque se você não se esforçar o tempo todo, vai ser esquecida.

E quando alguém aprende isso, começa a viver em alerta.
Qualquer ausência, qualquer demora em responder, qualquer mudança de tom vira um sinal de atenção.
O coração dispara, a mente começa a buscar explicações, e antes que perceba, a pessoa já está reagindo.

“Será que eu fiz algo errado?”
“Será que não sou mais importante?”
“Será que estão me deixando de lado?”

Essa sequência de pensamentos é exaustiva.
E embora, do lado de fora, pareça apenas drama ou carência, do lado de dentro a pessoa tá em pânico.
Porque o que está em jogo não é o convite pra uma pizzaria, mas a sensação de pertencimento, de ainda ter um lugar na vida do outro.

A grande ironia é que, ao tentar garantir esse lugar, essa pessoa acaba se afastando do que mais deseja: a conexão genuína (que também nasce por parte do outro).
Porque ninguém aguenta viver sob a pressão constante de provar amor, de tranquilizar inseguranças o tempo todo.
E aos poucos, o medo de ser deixada de lado vai provocando justamente o afastamento que ela mais teme.

É o que acontece quando a ferida emocional assume o comando.
Em vez de buscar acolhimento, ela cria defesas.
E uma dessas defesas é transformar tudo em algo pessoal, porque assim, o sofrimento parece mais controlável.
“Se doeu, é porque fizeram comigo.”
“Se me esqueci, é porque não sou importante.”
Pensar dessa forma é dolorido, mas é uma tentativa de manter o controle sobre a dor.

Só que, no fundo, nada disso é sobre o outro.
É sobre a própria pessoa.
Sobre a criança que aprendeu que precisava ser perfeita pra não ser deixada.
Sobre o adolescente que se acostumou a fazer de tudo pra ser aceito.
E sobre o adulto que ainda tenta garantir, a cada gesto, que ninguém vá embora de novo.

Entender isso muda muita coisa.
Porque quando a gente começa a enxergar o que está por trás do comportamento, em vez de só reagir a ele, o julgamento se transforma em empatia.
E a empatia abre espaço pra algo essencial: o cuidado.

Cuidar dessa ferida não é fácil.
É um processo que começa quando a pessoa se dá conta de que está repetindo o mesmo ciclo.
De que a sensação de rejeição aparece mesmo quando, objetivamente, ninguém a está rejeitando.
E é nesse ponto que o autoconhecimento começa a fazer sentido.

Reconhecer onde e porque dói é o primeiro passo pra mudar a forma como a gente se relaciona conosco e as pessoas ao nosso redor.
E, com o tempo, é possível construir uma nova forma de construir vínculos, mais leve, mais segura e mais verdadeira.

Isso não significa se tornar “frio” ou “independente demais”, mas aprender a se ancorar dentro de si.
Aprender que o afeto não se mede pela frequência com que o outro te convida, te responde ou te confirma o que você já é.
E confiança é o que permite que o vínculo exista sem sufoco.

Quando essa ferida é cuidada, o olhar muda.
A ausência do outro já não é mais interpretada como rejeição, mas como parte natural da vida.
O silêncio já não dói tanto, porque o vazio começa a tomar um novo significado.

E a partir daí, os vínculos também mudam.
Deixam de ser campos de disputa e passam a ser espaços de encontro.
Porque, finalmente o afeto se torna uma escolha.

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